O desejo virou obsessão, a obsessão virou tortura.
O pico encontrar-se à vista em muitos momentos da trilha.
Tentava localizar a linha da subida.

Tentava enxergar por onde ir. Qual encosta deveria subir.
 Tentando imaginar qual seria meu tamanho naquele topo de morros.
O pico do Inficcionado representa (legi-signo visual) a silhueta da barriga e as botas de um gigante deitado. Ganhou esse nome de moradores locais que “enxergavam” na barriga do colosso, um umbigo infeccionado. Pelo menos reza a lenda.
por esse trajeto é preciso passar pelo pico do Verruginha, que deve estar a minha esquerda, ao qual atribuem o formato de um carro (um Volks, mais precisamente falando). Esse lugar, a Reserva Natural Santuário do Caraça,
é cheio de signos linguísticos!
Que representa, determina, aponta, sinaliza, indica (o caminho...)
Caráter vicário (não vigário) do signo semiótico que dá (deu e continua dando. cada geração enxerga os locais a partir da relação eu teve com a cultura.) nome a natureza.
É uma boa referência quando se trata de: o que ver, quando ver o que, assim por diante.

O tal pico do Verruginha eu nunca soube onde é, de fato, sendo que só consigo localiza-lo lá debaixo. Pelo alto só imagino que seja, pois perde seu formato característico.
Ao invés de um fusca, parece só mais um morro.
Dizem os guias que lá tem toca e tudo (abrigo seguro).
Mas eles também sabem onde coletar água.
 Eu nem faço ideia de como funciona o esquema.
Apenas imagino.

Assim que venci o morro que leva aos campos do pico lembrei-me de uma passagem por aquele lugar.
Uma vez que subimos o Inficcionado pelo “escadão” (caminho usual) vimos uma canela de ema centenária que o nosso amigo e guia João Julio fez questão de envolver em historias.
Ela ainda apontava marcas de um incêndio ocorrido, segundo ele, quando ele tinha oito anos. João Júlio é um sexagenário.
O ciclo de crescimento dessa planta é muito lento devido ao ambiente árido onde ela cresce. Essa media 1,70 de altura e devia ter mais de 1 metro de diâmetro.
Os biólogos estimam que esse individue deve ter entre 300 e 400 anos de vida.
Ele nos diz que talvez o próprio Don Pedro segurou-se nela pra subir.
Que honra! Pegar onde o imperador passou as mãos sujas.
O fato é que assim que vencido o morro cheio de arbustos, na trilha à beira do abismo, na beira da encosta, a primeira visão que se tem é: uma canela de ema igual do de maior tamanho.
O que me faz rir é a Pesseguinho (que havia chegado primeiro) que naquela canela de ema talvez, um dia, Don Pedro pendurou a cueca pra secar!
 É válido, é possível, é justo...

Nesse ponto da trilha sinto uma saudade imensa dela. Saudade de quando andávamos juntos. Nunca houve discórdia, talvez, mas nunca enjoávamos de rir um do outro e degustar os panoramas mais lindos, crepúsculos e alvoradas. Céus divinamente estrelados. A vegetação resplandecendo em cada época do ano. A Lua em vista em ciclos e fases diferentes, admirada em distintos lugares.
Devo admitir:
 Você nós deu muita alegria.
obrigado!
Mas naquele momento... meu corpo fervia por dentro.
Meu cérebro estava sendo cozido lentamente, assim como todos os meus órgãos internos.
Não apenas minha pele que eu cobria com pano, mas minhas vísceras.
Pedia pra alcançar logo o leito do rio.
Clamava mentalmente, em Seu nome.
“água pra beber e refrescar, água pra beber e refrescar, água pra beber e refrescar, água pra beber e refrescar, água pra beber e refrescar, água pra beber e refrescar”
é disso que eu me lembro claramente. Foi marcante, um pranto, um pedido de clemência egóico. Não sabia que outros ainda estavam por vir.
o que fizeste? Onde estavas? onde foste? perguntava,
em silêncio mais íntimo, por tudo que me fizeste sofrer.
Como pode? Por quê?
Eu também não sou seu filho?
Não mereço ser seu filho?
Tuas lágrimas secaram?


“O deserto cresce. Ai daquele que oculta desertos!”

Comentários

Postagens mais visitadas