Sobre O Cão, de Vladimir Kotilevsky - por Cláudio Rodrigues




Sobre O Cão
de Vladimir Kotilevsky



 Os Novíssimos por Cláudio Rodrigues
Um antigo play-boy, conhecedor do submundo chique de sua cidade, resolve de repente ser detetive particular. Sua primeira cliente é uma conhecida socialite, que lhe contrata para seguir seu marido, pois suspeita que ele tenha uma amante. Ao começar a investigação, o protagonista se enreda em uma trama que se complica a partir de um duplo homicídio e a notícia a respeito de uma certa “Carta dos Inconfidentes”.


 
Este thriller, com todos os ingredientes de um romance policial noir, crimes, suspense, amor, sexo, enigmas, paisagens urbanas, mesclados a reflexões filosóficas recheadas de ironia, se passa na cidade de Belo Horizonte, nos anos 90, e tem como cenário principal a região da Savassi.
Seu autor, Vladimir Kotilevsky, nascido em Moscou, aportou em terras brasileiras aos 9 de idade, tendo estabelecido-se com a família em Belo Horizonte, onde se formou em Biologia pela UFMG. É Cônsul Honorário da Federação Russa na cidade. Estreou na literatura com o livro Cartas de Lucomonte. Seu segundo livro, Sábado do Vapor, publicado em 1994, é uma reunião de histórias em que o autor procura resgatar o universo do underground chique da capital mineira nos anos 80.
Dedicado ao escritor Roberto Drummond, amigo do autor, publicado no ano passado pela Editora Scriptum, O Cão expõe o mesmo ambiente que o romance anterior de Kotilevsky. Escrito na primeira pessoa, o romance tem como ponto alto sua linguagem lapidar, ágil, irônica, cheia de referências, da chamada alta cultura a cultura pop, que urde um texto vibrante e inteligente que prende o leitor desde a primeira página e o conduz aos meandros do submundo rico da cidade, apresentando a cada frase, uma surpresa. Segundo o autor, seu romance possui “uma beleza crua e vulgar, como uma prostituta cara”.
O autor peca, porém, por não conter um certo esnobismo, que resvala às vezes na linguagem, mas não a atrapalha, e muitas vezes em suas referências, principalmente sobre os nomes de ruas de Belo Horizonte e lugares conhecidos, bares ou shoppings. Ou quando um amigo do protagonista aparece em uma boate gay usando chapéu, numa cena que faz lembrar a de filmes norte-americanos da década de 40 e 50, mas que no livro parece forçado e atrapalha a verossimilhança, mesmo em um livro que não se pretende realista. As cenas de sexo também em geral são forçadas, parecendo conversas de homens querendo se exibir uns aos outros quanto ao presumível prazer que dá às suas amantes. Há também um excesso de referências culturais que muitas vezes não são necessárias. Há também alguns enganos, como a serra da Mantiqueira sendo vista do bairro Gameleira, ou como um risco de lua minguante que aparece à tarde, o que é impossível.
A despeito destes deslizes, que não são poucos, o romance de Vladimir Kotilevsky agrada e prende o leitor. Trata-se de trabalho de um escritor já experiente com a linguagem, que a trata com familiaridade e segurança. Faz uma crônica da cidade, pertinente e eficaz, misturando os ambientes da marginália e da alta-sociedade, em nossa capital, ainda que uma metrópole, ainda provinciana, numa trama surpreendente.

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