Ensejo...




Continua aqui tudo aquilo que fugiu da minha cabeça pela rua, fugiu da pena e pela pena em que escrevo. Se não está aqui e se aqui estivesse e se eu estivesse aqui esse azul que preenche lacunas, mas agora você está próxima de chorar. Esse desastre doméstico e coisas mais complexas. Tudo que você prometeu sem ver. Arquitetos da Roche planejam uma pastilha-ponto-psico-caótico. Escrevo essa carta sob o crivo do olhar alheio. Falsificador de poesia para não haver censura redundante. Escrevo pensando no silêncio agora. Não digas que é o fim tentando não entender floreios e voltas, mas a dor mística encara seu fascínio. Seja minha, seja sua, seja, de quem for, do tempo vazio interior da letargia em contraponto ao tédio. Entrego-me à vida sem dúvidas e receios. Minha carta elaborada come palavras. Nada de redenção! e nenhum alívio. Mas eis que aqui estão! caídas como as harpias de Zeus, anjos do próprio demônio. Depois de algumas tantas tentativas, ter limite um tanto rebelde, a tendência de abolir o erro. Minha perda de fôlego é proporcional ao fôlego daquilo que duvido. O erro redefine a cor daquilo que propõe, secretamente. O ambiente das tragédias é o que move o mundo.
Uma festa pagã para um deus Pã. As horas passam e a dor não volta atrás, acelera. Um grito de mulher quebra o silêncio da madrugada, bem clichê. Correr como um lince, morrer no asfalto. Aquela noite não foi apenas uma noite, foi a noite da ‘lei seca’ em que uivamos pra Lua no terraço da casa da Bailarina. Sentia nas veias sujas de sangue sujo avinagrado aquele amor impossível, inviável e antagônico. Apesar de, por dentro, minha revolta com a vida, com o mundo, a minha revolta enlouquecida de álcool, de vinho, de cachaça, uísque e velho barreiro, ouvindo Billie Holiday, Chet Baker e Marvin Gaye... Não pude evitar tocar aqueles seios negros, perceber o amor estranho amor entre eles. Esse meu amigo, homossexual indefinido de muita força vital de homem, e um lado feminino estranhamente forte. Essa noite a Bailarina jogou as cartas para ele. Brindamos com belo vinho, cantamos em coro, choramos juntos à vida e à alegria. Também não podia definir That Black beauty psicanalisada, That Black beauty que já leu Feuberbach, Kierkgaard e os modernos Samuel Beckett, Vergílio Ferreira. Entende um pouco da vida, é médica e mora em Brasília. Aquela voz um pouco rouca e eu, um pouco louco. Não estava mais ao meu alcance entender aquele amor. Um amor de épocas passadas, um amor condenado, um amor tolerante, clemente, intenso e desumano ao mesmo tempo. Um amor que não encontra nada em si sobre ele mesmo. Que goza pelo cu. Que ama uma mulher e um homem. Não eu, ele.

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