Solidão e arte


Para Cláudio Rodrigues da Silva

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Mori, Jorge (1946) Self-portrait


;Toda arte nasce de uma falta, de uma lacuna, de uma insatisfação fundamental. Precisamos da arte, da ilusão, da falsificação, do sonho, para não morrermos pela verdade. A verdade é feia. É insuportável quando olhada nos olhos. A arte é uma maneira de lidar com a angústia, mais precisamente a angústia da castração. Através da criação da ilusão o artista não cessa de plasmar, refazer, erigir, demolir e impor um novo sentido àquilo que permanece suspenso, que se lhe oferece, mas, ao mesmo tempo se esquiva, resiste e subtrai. Continuamente o artista joga com a aparência, a superfície, forma, som, cores, tato, e assim, cria novas verdades, novas significações, interpretações. Novas valorações. A própria arte é um sintoma que desnuda, e esconde ao mesmo tempo a tentativa de colmatar uma falta que nunca cessa de completar-se, porque nunca termina de começar e recomeçar. Paradoxalmente, a solidão, as dores e tudo mais que acarreta esse estado de saúde, tanto mais os seus textos dizem “sim” à vida e a tudo aquilo que ela representa de ameaçador, horripilante, sombrio, e também forte, potente, luminoso transbordante e belo. Os seres que superabundam em potência são também aqueles que sofrem, desejam e carecem. Assim sendo a vista se torna mais aguda e delicada, os passos se tornam mais leves e sutis, e os ouvidos a fruir uma nova música.  É preciso viajar em si mesmo, através de labirintos, cavernas e abismos. É-se obrigado a descobrir os improvisados atalhos, veredas, recessos, desvios e saídas esconsas por onde o pensamento conduz e seduz o artista. Somente a dor liberta e dá forças. Somente grande a dor, aquela longa, intensa, ardente e calcinante dor constringe a descerão mais profundo abismo e despojar-se de todo otimismo, todo altruísmo, toda edulcoração, de toda confiança e toda solução terra-a-terra.

De tudo que se escreve, eu amo somente aquilo que se escreve com o próprio sangue. Escreve com o sangue, e então aprenderás que o sangue é espírito.
Assim falou Zaratustra, Do ler e do escrever.




Comentários

Anônimo disse…
profundo, que alcançou o pré sal
Gustavo disse…
viva o pré
sal!
Ledoengano disse…
piu piu

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