Ontem


Faz tempo que quero escrever. Quase todo dia eu confronto essa tela em branco, mas não consigo. Não consigo alinhar as curvas da paisagem. Nasci em 1978, em fevereiro. Agora a janela está aberta. É véspera de natal. Não me sinto confortável. Hoje é dia vinte e dois. Vamos nos mudar dia vinte e nove. Daqui para outro lugar aqui mesmo. Eu não gosto daqui. Com todas as letras. Não houve primeira noite aqui. Se houve foi tão rápida e traumática como uma faca que  corta "o mal pela raiz". Não haverá uma adaptação a esse lugar, essa cidadela à beira do asfalto. Pra lá ou pra cá, tanto faz. Nada mais faz sentido. Um deserto de silêncio dentro do silêncio.  Eu deixo de falar a cada dia. Assim preencho uma camada do tempo. Por fora e por dentro. Revisitando lugares que eu nem me lembro, ou lembrava. Ficar sentado no mato do quintal... e o silêncio, o vento, o frio, os pássaros. E as folhas da palmeira balançam. Não quero lembrar daqui nem sentir saudades. Nada mais faz sentido.

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