Domingo, 23 de outubro de 2011.



16h40


Caro Caio,




Há muito tempo não escrevo cartas – essas palavras que quase sempre tem timbre melodioso e bucólico. Bucólico como hoje se apresenta o dia. Escrevo porque as palavras não podem se defender, embora eu não queira magoar, pelo contrário, manipulo as palavras (não por isso eu seja “falso”) para que elas sejam um alento, como um chá quente e o suave barulho da chuva. Vida estranha em que o cérebro traduz o que o coração pensa. Tentei escrever no papel, a próprio punho, e mandar uma carta – essa missiva retrô – mas Os Correios estão de greve e acho que essas chegarão mais rápido até você. Além do que, me perco nos meus rabiscos, o papel tudo aceita. Queria apenas a medida exata daquilo que pretendo expressar. Acho que apenas serviria como algo documental, agrada-me essa idéia. Algo para ser lido e relido por nossos biógrafos, sem precisar de um computador.


Afinal, quem tem 894 amigos, senão no FACEBOOK? Tenho quase trezentos seguidores e já me considero sacerdote de alguma coisa. Estimo a todos eles, mas a enorme maioria não me conhece, de fato. Não sabe quem sou, além desse tecido de palavras, dessa tessitura virtual. O que nós aproxima, caro amigo, é o mesmo que os distancia. As inúmeras noites fractais, intermináveis conversas sobre a assimetria da existência e o Nada subjetivo. E os dias de reflexão e ressaca, bebendo cerveja na calçada a meia quadra da padaria. Mesmo que as pessoas leiam, não conseguiriam interpretar a mobilidade intrínseca das palavras, o movimento orgânico insólito e único, a estrutura metafísica básica de tanta e tamanha prosódia. Mas não desejo fazer um tratado ou ensaio sobre o mundo cibernético. Talvez dizer o inexprimível, pra que eu mesmo me entenda. Queria que a morte fosse uma coisa mais humanizada. Como uma história sem fim...

(continua)

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