por Renata Ferri

Contos de verão

O pé de manga

Mangueira, né. Mas para não confundir com a escola de samba ou o instrumento de molhar o jardim, chamemos hoje de pé. Juliana, que tinha um rosto encantador e as coxas grossas, menina da cidade que cantava Elis Regina ao som do saxofone, nunca tinha subido em árvore. Com o pé carregadinho de manga ubá, era até perigoso ficar ali embaixo dando sopa, pois as frutas caiam bombardeando qualquer cabeça com o suco amarelo.
Decidida, Juliana inventou e disse que por aquela estrada de terra que ia até a cidade ela não voltava, sem antes conquistar o tronco nas alturas e chupar manga do pé. Por favor garçom, um drink, mango daquiri, aqui para a cantora molhar a voz. Desta vez não seria assim, nada de liquido em caixinhas, garrafas ou copos sobrepostos em bandejas. Ela queria buscar o néctar com as próprias mãos.
A claridade do dia nublado invadia as frestas deixadas pelas tantas folhas verdes que povoavam a copa da árvore. Tentou alcançar o galho mais baixo, porém, as pernas curtas e grossas não permitiram que isso acontecesse facilmente. Recebeu ajuda do amigo, que ofereceu pezinho. E pra cima ela foi. E estava sentada longe do chão, com o galho firme entre as pernas.
Não era suficiente. Juliana ficou de pé, trepou no tronco. Agora já não tinha medo de nada, sentiu-se protegida pelo perigo da queda. Se fosse para se espatifar, que fosse com mais tenra manga na mão. Macaco, bicho preguiça, jabuticaba tiveram inveja da destreza desenvolvida por Juliana em busca do objetivo. De mão cheia, catou a fruta mais atraente que havia em seu campo de visão. Com os dentes, arrancou a casca e mordeu, sugou o gosto doce que escorreu pelo canto da boca, na blusa de boutique e melou os cabelos soltos, longos.
Quando todo o prazer havia terminado, a menina cantora olhou para baixo e viu que não conseguiria descer e nem sequer sabia como e porque tinha chegado tão alto. Como solução, chamou o garçom, pediu uma escada e um drink de morango, fruta que nasce no chão. 

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