Dói que samba
O samba dói.
Mais uma vez, toca este samba. Me dá este tiro no peito pra eu chorar. Meu
barraco pegou fogo. Meu time perdeu outra vez. Minha mulher dançou pro outro
olhar, num bar qualquer. Me dá este tiro no peito. Me tira esta coisa de
dentro. Um sabiá, uma laranjeira, uma beca bacana e um calçado legal.Eu sambava na
roda e achava que era o bamba e tal. Já sambei no asfalto, batuquei em
caixa-de-fósforo um samba que só eu sei e a diaba da mulher me faz um negócio
desses?! Dança pra gringo ver e me dá só uma merreca. Depois eu bato em mulher
e o pessoal ainda acha ruim. Mas como eu vou fazer uma assim andar nos trilhos.
Me dá este tiro logo, que me dói a dor nos cornos.Eu quebrava o
barraco todo dia. Jogava prato pro alto. Jogava panela porta afora. Batia no
menino, batia no cachorro, batia na mulher e no vizinho. Comprava fiado na
esquina e não pagava. Tomava uma pela manhã que só acabava à noite. E me
deitava com todas que queria. Agora que larguei minha mulher por essa aí, esta
me fura os olhos! Me dá um tiro logo que eu quero chorar e o choro não sai, só
essa coisa esquisita, essa gosma no peito, essa chiadeira na alma, esse
desassossego no ventre, esse padecer de par de chifre. Putzgrila! Puta que o
pariu, lá dela! Me passo o fogo logo ou eu me atiro pela janela. Mas nós tâmo
num barraco meu chapa! Pula da janela que não quebra nem um osso. Então me dá
um tiro logo, malandro, que esse samba me dói pra caralho!
Cláudio Rodrigues
Cláudio Rodrigues
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