1930 – ano do cavalo



A ironia de Sócrates






Quero talvez repetir o que já disse a você, reafirmando em palavras o que me foi revelado durante o caminho pela geografia do meu próprio deserto. O homem sente a terrível compulsão por si mesmo. Ele a coloca em estados de consciência que lhe dão prazer. Não digo o prazer imediato alcançado através da droga, mas o pensamento de prazer. O fato de não se haver analisado a fundo, mas apenas conhecer esse pequeno, aparentemente grande, estado de prazer do pensamento induz ao materialismo, e o materialismo, como sabemos, leva a compulsão pelo objeto.
Seria pretensão de minha parte tentar elaborar um resumo de tudo me que foi dolorosamente transmitido. No silêncio das horas, como agora. Nas incontáveis madrugadas que passei a buscá-lo e perquirindo cada detalhe do contexto.  
Na ironia da lembrança não sei determinar se é dia ou noite. Mildred me disse uma vez que “ ninguém sofre por que quer” parece que sim, mas pode ser que não. Depende da dor. Talvez ou fosse o último dos românticos? Não sei. A resposta dessa pergunta é um enigma. Exaltar a dor é uma característica de quem pede socorro. Os românticos já nascemos mortos. A impressão que tinha era essa. Atravessei sem pressa as terras áridas dessa ilha deserta –
que sou eu próprio.

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