Noites Adentros, NY
p a r t e 7 Samuel
>>¨<<
(c o n t i n u a)
Fiquei sozinho na cozinha. “Dez minutos” – disse a Gi olhando pro forno. As pessoas entravam me olhavam, mas não me cumprimentavam. Pensei que eu fosse alguma atração exótica. As pessoas dirigiam-se para a varanda da frente. A casa era grande, dois andares, uma sala grande com lareira, dividida em dois ambientes, a cozinha, e um deck de madeira na frente que dava vista para a cidade. Até que ela chegou para preparar tudo “desculpe-me a demora” – disse com voz de dona-de-casa “e grazzi pela ajuda”.
__ Por nada – me diverti muito aqui, pensei.
Assistimos à exibição dos slides do Paolo. Ele quase não aparecia porque era o fotógrafo da equipe. Aparecia aqui e ali e as pessoas ah... Oh!... marcou-me uma - ele no cume com a foto da mãe (falecida) dando tchauzinho.
Depois do jantar, um tradicional e prático assado, próprio para comer nessas ocasiões, porém regado a um bom vinho francês, Bordeaux, safra especial. A Gi cozinhava bem, e fazia bem comidas típicas da montanha, no entanto era contra os hermetismos da tradição. Eu e Gislene conversamos na varanda, apesar do frio. A Gi entra nessa história porque também sofreu, na França. Sofreu como a Costa do Marfim sobre protetorado francês. Depois de uma viajem em fuga pela Europa e pela África, estacionaram a Kombi na casa do Sam (que morava com a avó) em Le Lavancher, e foram para Chamonix. O Sam logo arrumou um emprego no restaurante cuja especialidade era o típico alpino tarte a flet. Ela, depois de mostrar que sabia arrumar uma cama, dobrar os lençóis, limpar um banheiro e pronto! estava contratada. Mais uma vez foi por conta de sua beleza, ela tinha uns vinte e três anos, foi promovida à recepção. ”De tanto falar oui oui merci de rian... aprendi o francês. Da noite pro dia soltei a língua e comecei a falar. Isso ao invés de ajudar, me rendeu mais dor de cabeça." e depois de um grande suspiro disse "Um ano se passou e o Samie não ligava mais pra mim. O lance dele era ser adolescente e praticar snowboard, beber vinho e mais nada. Até que o Paolo apareceu no hotel pra levar um grupo de japoneses ao cume do Mont Blanc. Arrumei minhas coisas e vim embora com ele. Agora estou aqui isolada mais uma vez.”
Dados os trâmites de despedidas e agradecimentos por encerrados, fomos embora, descendo a ladeira. Nossa cabana ficava do outro lado da cidade. E era chegada a hora do silêncio.
Na cama, abro um pequeno caderno esquecido, e encontro as contas de casa com a letrinha dela – aluguel, água, luz, IPTU, telefone... As lembranças esquecidas ou jogadas fora. Arrancadas como erva daninha, danosa, enraizada. Parti, quando tive que sonhar novos horizontes. Quando você sabe que ficou para trás, velha pele? De repente a serpente que engole o próprio rabo, hiberna em estado consciente. Estando eu em mim, parindo minhas cobrinhas, sinto vontade maternal de devorá-las. Nada é tão bonito quanto aquilo que se vê pela primeira vez com encantamento, que fascina que faz os olhos brilharem. Só se deixa ser vítima quem já perdeu a inocência. Pesseguinho queria de mim algo intangível. Queria como que eu materializasse o éter, o metafísico, para provar meu amor por ela. Embora insistisse várias vezes dizendo que eu não tinha esse poder. Ela foi a primeira e única a me ajudar nos momentos que estive mal, nos momentos que estive perdido. Cuidava de mim como se cuida de uma criança. Eu queria algo novo e descobri a tristeza e o desdém. A solidão e o medo faziam par perfeito. Era preferível cair no esquecimento. Na solidão noturna do esquecimento, nas sombras de si mesmo. Descontente e contente ao mesmo tempo. Por não ter que seguir uma rotina doméstica e de trabalho. Todo dia fazer o mesmo trajeto de tempo, acordar as sete trabalhar as oito comprar pão as dezoito.
A noite tinha sido boa, mas naquela época o passado estava impregnado em mim.
__ Por nada – me diverti muito aqui, pensei.
Assistimos à exibição dos slides do Paolo. Ele quase não aparecia porque era o fotógrafo da equipe. Aparecia aqui e ali e as pessoas ah... Oh!... marcou-me uma - ele no cume com a foto da mãe (falecida) dando tchauzinho.
Depois do jantar, um tradicional e prático assado, próprio para comer nessas ocasiões, porém regado a um bom vinho francês, Bordeaux, safra especial. A Gi cozinhava bem, e fazia bem comidas típicas da montanha, no entanto era contra os hermetismos da tradição. Eu e Gislene conversamos na varanda, apesar do frio. A Gi entra nessa história porque também sofreu, na França. Sofreu como a Costa do Marfim sobre protetorado francês. Depois de uma viajem em fuga pela Europa e pela África, estacionaram a Kombi na casa do Sam (que morava com a avó) em Le Lavancher, e foram para Chamonix. O Sam logo arrumou um emprego no restaurante cuja especialidade era o típico alpino tarte a flet. Ela, depois de mostrar que sabia arrumar uma cama, dobrar os lençóis, limpar um banheiro e pronto! estava contratada. Mais uma vez foi por conta de sua beleza, ela tinha uns vinte e três anos, foi promovida à recepção. ”De tanto falar oui oui merci de rian... aprendi o francês. Da noite pro dia soltei a língua e comecei a falar. Isso ao invés de ajudar, me rendeu mais dor de cabeça." e depois de um grande suspiro disse "Um ano se passou e o Samie não ligava mais pra mim. O lance dele era ser adolescente e praticar snowboard, beber vinho e mais nada. Até que o Paolo apareceu no hotel pra levar um grupo de japoneses ao cume do Mont Blanc. Arrumei minhas coisas e vim embora com ele. Agora estou aqui isolada mais uma vez.”
Dados os trâmites de despedidas e agradecimentos por encerrados, fomos embora, descendo a ladeira. Nossa cabana ficava do outro lado da cidade. E era chegada a hora do silêncio.
Na cama, abro um pequeno caderno esquecido, e encontro as contas de casa com a letrinha dela – aluguel, água, luz, IPTU, telefone... As lembranças esquecidas ou jogadas fora. Arrancadas como erva daninha, danosa, enraizada. Parti, quando tive que sonhar novos horizontes. Quando você sabe que ficou para trás, velha pele? De repente a serpente que engole o próprio rabo, hiberna em estado consciente. Estando eu em mim, parindo minhas cobrinhas, sinto vontade maternal de devorá-las. Nada é tão bonito quanto aquilo que se vê pela primeira vez com encantamento, que fascina que faz os olhos brilharem. Só se deixa ser vítima quem já perdeu a inocência. Pesseguinho queria de mim algo intangível. Queria como que eu materializasse o éter, o metafísico, para provar meu amor por ela. Embora insistisse várias vezes dizendo que eu não tinha esse poder. Ela foi a primeira e única a me ajudar nos momentos que estive mal, nos momentos que estive perdido. Cuidava de mim como se cuida de uma criança. Eu queria algo novo e descobri a tristeza e o desdém. A solidão e o medo faziam par perfeito. Era preferível cair no esquecimento. Na solidão noturna do esquecimento, nas sombras de si mesmo. Descontente e contente ao mesmo tempo. Por não ter que seguir uma rotina doméstica e de trabalho. Todo dia fazer o mesmo trajeto de tempo, acordar as sete trabalhar as oito comprar pão as dezoito.
A noite tinha sido boa, mas naquela época o passado estava impregnado em mim.
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(c o n t i n u a)
Comentários
Mas conhecer a alegria embriagante de se estar preso a uma liberdade estranha leva sempre a procura de uma nova pele. Não tem fim. A alegria!
Forte abraço
Um dos melhores livros que li.
"hiberna em estado consciente"
ötima percepção continuada, não é atoa que soy una fan de su pensamiento filosófico.
e quanto aos videos, aprendi a pôr.
Mas obrigado mesmo assim.
bjs