Nietzschidas
O que nos incita a olhar todos de
uma só vez, com desconfiança e troça, não é porque percebemos quão inocentes
são as pessoas, nem com que facilidade se enganam repetidamente. Em outras
palavras, não é frívolo nem infantil indicar a falta de sinceridade com que
elevam um coro unânime de virtuosos e lastimosos protestos quando se toca,
ainda que superficialmente, o problema de sua sinceridade. Reagem com uma
atitude de conquista de suas opiniões através do exercício espontâneo de uma
dialética pura, fria e impassível, quando a realidade demonstra que a maioria
das vezes apenas se trata de uma afirmação arbitrária, de um capricho, de uma
intuição ou de um desejo íntimo e abstrato que defendem com razões rebuscadas
durante muito tempo e, de certo modo, bastante empíricas. Ainda que o neguem,
são advogados e frequentemente astutos defensores de seus preconceitos, que eles
chamam "verdades".
E ainda que não o creiam, estão muito longe de possuir o heroísmo próprio da
consciência que se confessa a si mesma sua mentira, isto é, muito longe
do valor que se deseja ouvir, seja para advertir um amigo ou para colocar em
guarda o inimigo ou para burlar a si mesmo.
Ainda há ingênuos acostumados à
introspecção que acreditam que existem "certezas imediatas", por
exemplo, o "eu penso" ou, como era a crença supersticiosa de
Schopenhauer, o “eu quero”, como se nesse caso o conhecimento conseguisse apreender
seu objeto pura e simplesmente, enquanto "coisa em si" sem alteração
por parte do objeto e do sujeito. Afirmo que a "certeza imediata",
bem como o "conhecimento absoluto" ou a "coisa em si"
encerram uma contradictio in adjecto (contraditório em si).
Seria pois, essa a ocasião de livrar-se do engano que encerram as palavras.
Nietzsche , Além do Bem e do Mal
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